O Bonefish é uma espécie que passa a maior parte do tempo em águas rasas, porém para desovar, eles fazem grandes viagens para o fundo do mar, mergulhando abaixo de 150 metros.
Não é fácil pegar um Bonefish. Desconfiados dos humanos, esses peixes prateados – apelidados de fantasmas cinzas – se misturam às planícies arenosas onde se alimentam e costumam fugir com extrema rapidez.
Várias espécies de peixes são encontradas em águas tropicais rasas em todo o mundo. Para capturar um peixe dessa espécie, pescadores habilidosos passam anos aprendendo como imitar os movimentos de presas do Bonefish. “É uma forma de arte absoluta”, diz Matt Ajemian, ecologista pesqueiro do Harbor Branch Oceanographic Institute. Quando mordem a isca, “esses peixes lutam bastante”, diz Ajemian. “Eles são verdadeiros gigantes – é por isso que as pessoas os amam”.
Seu apelido se refere não apenas à sua forma de evasão, mas também se encaixa em seus misteriosos hábitos de desova. Essa espécie costuma viver em águas com apenas alguns metros de profundidade, mas durante a temporada de reprodução no outono, eles desaparecem à medida que se juntam e vão em direção as águas mais profundas. Até recentemente, os pesquisadores não tinham ideia para onde esses peixes estavam indo.
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Ajemian e seu aluno de doutorado, Steve Lombardo, há anos tentam rastrear o bonefish (Albula vulpes), ao longo do norte das Bahamas, incluindo as ilhas Abaco. Depois de algumas temporadas, em novembro de 2019 a equipe marcou e começou a rastrear a espécie enquanto eles desovavam – e ficaram chocados com o que encontraram.
Conforme descrito em um artigo publicado na revista Marine Biology, os pesquisadores descobriram que o bonefish de Abaco viajou da costa até a borda próxima da plataforma continental – e então mergulhou a cerca de 150 metros. Eles também permaneceram em águas profundas por mais de duas horas.
Esse é um comportamento peculiar. “Nenhum peixe que vive próximo à costa ou que seja de águas rosas foi observado indo para o oceano aberto e para as profundezas desovar”, diz Lombardo.
A descoberta é crítica para a conservação porque “Se você não sabe onde os peixes estão desovando, como estão fazendo isso e as condições de que precisam, é muito difícil controlar sua população”, diz Ajemian. A espécie caribenha é considerada quase ameaçada pela União Internacional para a Conservação da Natureza, em parte devido à sobrepesca. Embora seja utilizado na culinária em alguns lugares, a maioria dos pescadores recreativos os escolhe para pescar e soltar. Eles são chamados de bonefish porque possuem ossos abundantes e densos “que tornam a retirada da carne muito trabalhosa”, acrescenta Ajemian.
Fugindo da costa
“Antes da desova, o bonefish forma grandes cardumes perto da costa ao anoitecer”, explica Ajemian. Por cerca de 10 minutos, eles saltam como golfinhos na superfície. “Então, eles simplesmente vão direto para longe da costa”, diz ele.
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Às vezes é um alarme falso – eles começam a jornada para o mar e, por algum motivo, retornam. Mas uma noite em novembro de 2019 – quando a lua estava cheia – tudo se alinhou. A equipe colocou um rastreador acústico dentro de um bonefish, para que pudessem rastrear a bordo de um navio fornecido pela Fisheries Research Foundation.
Enquanto os peixes nadavam para fora da costa, os cientistas também os vigiavam por meio de um sonar. Assim que chegaram à plataforma continental, numa jornada horizontal de apenas cinco quilômetros, os peixes mergulharam, ficando abaixo de 100 metros de profundidade por mais de duas horas. Eles se moveram para cima e para baixo um pouco, antes de fazer uma corrida final pra cima – de uma profundidade de 150 metros a 70 metros em menos de dois minutos – para desovar.
Essa rápida ascensão faria com que qualquer gás em seu corpo se expandisse e os ajudasse a expelir óvulos e espermatozoides, acrescenta Ajemian. Assim como os corpos dos bonefish são capazes de suportar as mudanças extremas de pressão, é desconhecido e sem precedentes para qualquer peixe costeiro, dizem os pesquisadores.
Gerando nas profundezas
Enquanto os pesquisadores rastreavam o bonefish, eles registraram a densidade da água, temperatura e outras variáveis. Eles descobriram que os peixes passam grande parte do tempo em uma região onde a água de superfície mais quente entra em contato com a água de fundo mais fria, mas não se mistura totalmente.
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Isso forma uma camada distinta que pode ser um lugar ideal para os ovos eclodirem e se desenvolverem, supõem os pesquisadores. Pequenos fragmentos de detritos chamados de “neve marinha” se acumulam aqui, o que provavelmente fornece alimento para os filhotes, diz Lombardo. A camada também possui uma temperatura relativamente constante e fornece algum abrigo contra tempestades e predadores.
Peixe Primitivo
O Bonefish não mudou muito em mais de 100 milhões de anos – e é provável que esse comportamento os tenha ajudado a resistir, diz Ajemian.
Embora a pesquisa tenha se concentrado em bonefish no oeste do Atlântico, “temos evidências de que esse comportamento pode estar ocorrendo com espécies de bonefish do Pacífico também”.
“Precisamos ter certeza de que podemos manter esses animais e seus comportamentos naturais”, diz Alan Friedlancer, ecologista pesqueiro e cientista-chefe do Projeto Mares Pristinos da National Geographic Society, que não estava envolvido no estudo. Se você prejudicar o comportamento de um peixe, incluindo sua desova, por meio de impactos humanos, como a pesca excessiva, poderá condenar grandes grupos de peixes sem nem perceber, diz ele. “Você nem saberia que [esse tipo de comportamento] estava presente naquele local, e pode ser muito importante para a sobrevivência deles”, completa.