Estamos familiarizados com o mito comum de que os peixes possuem pouca memória, mas o DNA desses animais tem a capacidade de armazenar muito mais memória do que a dos seres humanos.
Em um estudo publicado recentemente na revista Nature, pesquisadores da Universidade de Otago relataram que a memória na forma de “metilação do DNA” é preservada entre gerações de peixes, em contraste com os seres humanos, onde isso é quase totalmente eliminado.
O DNA é frequentemente comparado a um grande livro, com as palavras representando um manual de instruções para a vida.
A metilação do DNA codifica informações adicionais que estamos começando a entender.
Refere-se há um pouco como descobrir anotações manuscritas nas margens do livro dizendo quais páginas são as mais importantes, ou registrar informações recém-adquiridas.
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Em humanos, essas notas são removidas a cada geração, mas isso aparentemente não ocorre nos peixes.
O primeiro autor do estudo, Oscar Ortega, doutorando da Universidade de Otago, elabora: “A metilação fica em cima do DNA e é usada para controlar quais genes são ligados e desligados.
Também ajuda a definir a identidade e função celular. Em humanos e outros mamíferos, a metilação do DNA é apagada a cada geração.
No entanto, descobrimos que esse apagão da memória de metilação do DNA, não ocorre de forma alguma nos peixes que estudamos”.
Nos últimos anos, muita atenção tem sido dada à ideia de que eventos significativos, como a Guerra e a Fome, podem ter um efeito duradouro nas gerações subsequentes, através da herança de padrões alterados de metilação do DNA.
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Embora esses efeitos de memória de DNA “transgeracionais” pareçam ser potencialmente importantes, por causa de eventos de eliminação do DNA durante o desenvolvimento, acredita-se que ele seja extremamente raro em humanos.
No entanto, os peixes aparentemente não têm esses eventos de apagão, ou seja, parece ser possível que eles possam transmitir a experiência de vida através de seu DNA na forma de metilação.
Tim Hore, líder da equipe de pesquisa e palestrante sênior do Departamento de Anatomia da Universidade de Otago, diz que as descobertas do estudo fornecem novos caminhos para os cientistas estudarem como a memória dos eventos em uma geração pode ser passada para a próxima geração.
“Biólogos de mamíferos têm procurado por muito tempo encontrar exemplos confiáveis de onde padrões alterados de metilação do DNA são passados para gerações subsequentes; no entanto, apenas alguns foram verificados em estudos repetidos.
Diferentemente dos humanos, a metilação do DNA não é apagada a cada geração, pelo menos para alguns peixes. Então, pensamos que a transferência de memória entre gerações através da metilação do DNA pode ser muito mais comum nesses animais”, diz Hore.
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Também publicado na Nature Communications, um estudo complementar do Instituto Garvin (Austrália), confirmou as observações de Otago.
“É ótimo ter validação imediata de que nossos resultados são robustos – eles usaram diferentes técnicas e amostras de desenvolvimento, mas chegaram às mesmas conclusões que nós”, acrescenta Hore.
Os pesquisadores esperam que esse novo conhecimento em herança de metilação do DNA leve a um novo entendimento sobre quais segredos moleculares são passados dos pais para os filhos, em última análise, reescrevendo o livro da vida como o conhecemos.
Fonte da matéria:
Materiais fornecidos pela Universidade de Otago.
Referências:
- Oscar Ortega-Recalde, Robert C. Day, Neil J. Gemmell, Timothy A. Hore. Zebrafish preserve global germline DNA methylation while sex-linked rDNA is amplified and demethylated during feminisation. Nature Communications, 2019; 10 (1) DOI: 1038/s41467-019-10894-7